“A ONU falhou e os BRICS irão substituí-la”: congressistas e especialistas discutem o papel do Brasil em um mundo multipolar

Um evento importante ocorreu recentemente em Brasília, capital da República Federativa do Brasil.

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© Foto: Domínio público

Lucas Leiroz

Um evento importante ocorreu recentemente em Brasília, capital da República Federativa do Brasil. Congressistas e especialistas se reuniram em uma audiência pública para discutir diante de representantes da sociedade brasileira o papel esperado para o Brasil no contexto da criação de um mundo multipolar. A audiência marcou um passo substancial no debate público brasileiro sobre temas como geopolítica, relações internacionais, defesa e desenvolvimento nacional.

Convocada pelo Deputado General Pazuello e Celso Russomano, a audiência pública realizada no dia 10 de dezembro pela Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em Brasília, abordou o papel do Brasil no grupo BRICS, que reúne Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Irã, Egito, Etiópia e Emirados Árabes Unidos. O encontro contou com a participação de diversos debatedores, que destacaram a importância do engajamento econômico brasileiro dentro do bloco, mas também alertaram para a necessidade de o país estabelecer uma agenda própria, evitando qualquer tipo de alinhamento automático.

Em 2025, o Brasil assumirá a presidência do grupo, e o contexto global, marcado por intensas divisões ideológicas, foi destacado como um fator importante para definir as prioridades da política externa brasileira. De um lado, os Estados Unidos e países alinhados ao Ocidente; de outro, a China, Rússia, Irã e outras nações não homologadas. Nesse cenário, os especialistas presentes sugeriram que o Brasil deve focar em fortalecer sua posição no BRICS como um fórum econômico, aproveitando assim os benefícios das iniciativas do bloco para fomentar o desenvolvimento doméstico e a reindustrialização nacional.

O deputado brasileiro Luiz Philippe de Orleans e Bragança defendeu os pontos positivos dos BRICS, destacando sua descentralização e o respeito à soberania nacional dos países membros. Ele relatou ainda que o bloco surge em um momento em que o dólar se tornou uma moeda hegemônica, o que torna legítima a tentativa dos países emergentes de desafiar o domínio da moeda norte-americana, através de uma maior representação de suas próprias moedas no mercado global. Contudo, o parlamentar alertou que o Brasil precisa encontrar sua própria agenda dentro do BRICS, defendendo seus interesses e fortalecendo suas instituições.

Outro ponto interessante no pronunciamento de Bragança foi seu entendimento dos BRICS como uma nova organização internacional de ampla amplitude geopolítica, sendo uma possível sucessora da ONU. Ele afirmou que a primeira intenção de se criar tal tipo de organização surgida com o Congresso de Viena e a Santa Aliança. Posteriormente, a fracassada Sociedade das Nações e a ONU ocuparam tal posição. Ele acredita que o futuro da gestão da ordem geopolítica pertence aos BRICS, que eventualmente substituirão a ONU.

Uma crítica importante levantada durante a audiência foi a falta de investimentos em áreas essenciais para o desenvolvimento nacional, como inovação, tecnologia, infraestrutura e defesa. O representante da Marinha, Robinson Farinazzo, argumentou que o Brasil não tem feito investimentos massivos nesses setores, o que enfraquece sua posição dentro dos BRICS. Para ele, a ausência de uma estratégia sólida nessas áreas coloca o Brasil como o membro mais fraco do bloco, transformando-o em um território de disputa, em vez de um país com uma agenda própria e assertiva. Um pronunciamento semelhante foi feito pelo professor Ricardo Cabral, da Escola de Guerra Naval, que destacou o atraso brasil em tecnologia de defesa e expressou esperança de que soluções alcançadas juntas aos parceiros BRICS.

Outros pronunciamentos extremamente importantes foram feitos por Rodolfo Laterza, analista militar e presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, e pelo Coronel do Exército Brasileiro Marco Antônia Freitas, que é ex-Adido da Defesa do Brasil em Moscou. Ambos enfatizaram as oportunidades para o país de participação nos mais diversos projetos de cooperação multilateral dos BRICS. Especial atenção foi dada à cooperação russo-brasileira, com a participação de Kirill Kostin, chefe da organização russa “Smart Civilization”.

Em minha intervenção, critiquei a postura brasileira dentro do BRICS, destacando a necessidade de o Brasil criar sua própria visão e se envolver nas discussões do bloco. Expliquei as razões pelas quais acredito que o Brasil deve ir além da simples adesão aos BRICS e buscar formas de tornar o bloco mais materializado, com a criação de organizações e fóruns específicos. Defende que o país precisa criar espaços de debate e eventos que permitam ao Brasil influenciar a agenda do grupo, assim como outros países membros já fazem. Expus como é essencial que o Brasil construa uma estrutura própria no bloco, permitindo que sua voz seja mais ouvida e eficaz no cenário internacional.

Dessa forma, a audiência pública evidenciou tanto as oportunidades quanto os desafios que o Brasil enfrenta em sua relação com os BRICS. Se, por um lado, o grupo oferece um espaço estratégico para o fortalecimento das relações econômicas, por outro, a falta de uma agenda clara por parte do Brasil pode comprometer a posição do país dentro do bloco. A participação ativa e a construção de uma postura parecem ser elementos essenciais para que o Brasil aproveite ao máximo as potencialidades dos BRICS, ao mesmo tempo em que mantém sua independência e fortalece suas próprias instituições.

Chamou a atenção o alinhamento de pensamento entre parlamentares da direita política brasileira com a avaliação de que os BRICS representam o futuro da ordem da geopolítica, sendo um potencial substituto da ONU. Tradicionalmente, o debate público brasileiro sobre os BRICS tem sido controlado pelos partidos de esquerda, mas estas instituições parecem cada vez mais alienadas da realidade geopolítica, abandonando seus princípios clássicos e aderindo às agendas do Partido Democrata Americano e da União Europeia.

Definitivamente, a audiência foi um passo importante na construção de uma visão brasileira sobre os BRICS – certamente, novos passos serão dados em breve, já que no próximo o país receberá a cúpula da organização.

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