Representante da Davati denuncia grupos criminosos liderados por militares

Segundo Cristiano Carvalho, o pedido de propina para a compra de vacinas, que os envolvidos chamariam de “comissionamento”, teria partido do “grupo do coronel Blanco” e do coronel “Odilon”, que teria apresentado o representante da Davati Medical Supply no Brasil, o cabo PM Luiz Paulo Dominghetti, ao coronel Blanco.

Davati
Cristiano Carvalho, depoente na CPI da Pandemia, afirmou que não é CEO da Davati no Brasil e sim um representante informal. Edilson Rodrigues/Agência Senado

O representante de vendas da Davati no Brasil, Cristiano Carvalho, afirmou à CPI da Covid, nesta quinta-feira, que o pedido de propina relativo à compra da vacina da Astrazeneca partiu do “grupo do coronel Blanco”. O tenente-coronel Marcelo Blanco, então assessor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, esteve presente no jantar com então diretor de Logística, Roberto Dias, que teria pedido propina de US$ 1 por dose de vacina.

Segundo Cristiano Carvalho, o pedido de propina para a compra de vacinas, que os envolvidos chamariam de “comissionamento”, teria partido do “grupo do coronel Blanco” e do coronel “Odilon”, que teria apresentado o representante da Davati Medical Supply no Brasil, o cabo PM Luiz Paulo Dominghetti, ao coronel Blanco.

Em seu depoimento, Carvalho diz ainda que a informação do “comissionamento” teria sido passada por Dominguetti após o jantar de com representantes do Ministério da Saúde. Carvalho, porém, acrescentou que não participou do jantar.

Contato com Dias

Ainda durante a oitiva na CPI da Covid, o representante da Davati afirma que ficou “incrédulo” com os contatos de Roberto Ferreira Dias. De acordo com ele, Dias buscou contato no dia 3 de fevereiro deste ano, por meio de mensagens e ligações.

Dias se apresentou como diretor de Logística do Ministério da Saúde.

Eu estava incrédulo que um funcionário do Ministério da Saúde estava entrando em contato comigo. Fui até checar na internet se ele era diretor mesmo, achando que poderia ser fake news, mas verifiquei que ele era mesmo funcionário do governo — acrescentou.

Favorecimento

Segundo a testemunha da CPI, Dias, no telefonema do começo de fevereiro, queria informações sobre como a vacina poderia chegar ao Brasil.

— Meu contato com ele sempre foi sobre comércio exterior, transporte internacional. Roberto Dias perguntou sobre preço, mas nunca disse sobre favorecimento. Foi algo sempre profissional — disse ele.

Carvalho também relatou à CPI da Covid a participação de uma série de coronéis das Forças Armadas em negociações suspeitas para a compra de vacinas contra a covid-19. A atuação desses militares, dentro e fora do governo, foi destacada pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE).

— Estamos falando do coronel Guerra, do coronel Boechat, do coronel Élcio Franco, do coronel Hélcio Bruno. Ou seja, temos uma associação de vários coronéis em torno dessa ‘operação Tabajara’ — ressaltou o senador.

Imunizantes

 O primeiro militar citado foi Gláucio Octaviano Guerra, coronel reformado da Aeronáutica. Ele atua como assessor do adido militar na embaixada brasileira em Washington. Segundo Cristiano, foi Guerra quem o apresentou a Herman Cardenas, CEO da Davati nos Estados Unidos.

A empresa chegou a oferecer ao governo brasileiro milhões de doses dos imunizantes da AstraZeneca. No entanto, a própria AstraZeneca negou qualquer relação com a Davati. Nas negociações, também foram oferecidas vacinas da Jansen ao ministério da Saúde. O governo canadense investiga a Davati por suposta oferta fraudulenta desses imunizantes.

Cristiano relatou, ainda, que no dia 12 de março participou de reunião que contou com a presença dos militares citados.

— Me levaram ao Ministério da Saúde o Reverendo Amilton, o Dominguetti, o Coronel Hélcio Bruno, do Instituto Força Brasil. Nas dependências do Ministério, estavam o coronel Boechat, coronel Pires e com o coronel e secretário Élcio Franco — acrescentou.

‘Comissionamento’

Envolvido nessas tratativas, o policial militar Luiz Paulo Dominguetti denunciou ter recebido pedido de propina de US$ 1 por vacina em negociação para a aquisição de 400 milhões de doses da AstraZeneca. De acordo com ele, a solicitação de propina teria sido feita pelo ex-diretor do departamento de Logística do ministério Roberto Ferreira Dias. Ele nega as acusações.

Em depoimento à CPI, Cristiano disse não ter tomado conhecimento desse pedido de propina. Mas relatou que Dominguetti se referiu a um pedido de “comissionamento”. “Ele se referiu a esse comissionamento sendo do grupo do Tenente-Coronel Blanco e da pessoa que o tinha apresentado ao Blanco, que é de nome Odilon.”

Por fim, o coronel da reserva Élcio Franco foi secretário-executivo do Ministério da Saúde, durante a gestão do general Eduardo Pazuello. Em janeiro, ele ordenou aos demais órgãos da pasta que fossem concentradas nele todas as tratativas para negociações de imunizantes contra a covid-19. Franco foi exonerado em 26 de março, dias após a saída de Pazuello. Desde 23 de abril, ele é assessor especial da Casa Civil, ministério sob comando do general Luiz Eduardo Ramos.

‘Mentindo’

Até mesmo o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), chegou a admitir estar constrangido com os diálogos mostrados por Cristiano revelando a participação dos militares nas negociações dos imunizantes. Contudo, afirmou que as “contradições ou equívocos, ou falhas, ou transgressões” cometidos pelos agentes não resultaram na compra de vacinas.

O relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL) reagiu. Ele lembrou que apenas o pedido por vantagens indevidas, mesmo que não tenham sido efetivamente pagas, já caracterizam crime de corrupção ativa. O senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da Comissão, foi ainda mais longe.

— Nós não podemos generalizar, mas o senhor poderia me informar, senador Fernando Bezerra, o que o coronel Elcio Franco ainda está fazendo lá, ao lado da sala do presidente? Falando pelo governo e mentindo, mentindo? — concluiu.

Fonte: CdB

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