Partiu usar a Bíblia em sala de aula!

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Iolene Lima. Foto: Reprodução

O ministro da educação Ricardo Vélez anunciou Iolene Lima para chefiar a Secretaria Executiva do MEC. Na prática, ela será a número dois da pasta. Ela defende que a Bíblia deve ser a base para a Educação e cita Gênesis para que a criança aprenda matemática inicialmente por ele (no 1o dia Deus fez isso, no 2o dia aquilo, um, dois, três… dias da semana… Gênesis nas cabeça).

O vídeo com Iolene explicando didaticamente com podemos usar a Bíblia em aula de geografia, biologia e matemática está em todas as redes. Não deixem de ver.

Eu gostei disso de levar Bíblia para a sala de aula. Na verdade, adorei. Já quero.

Vamos ver alguns fatos para debatermos em sala de aula? Vamos!

Comecemos no Gênesis com a adorada história de Noé. A lenda dos animais entrando na arca aos pares.

Deus condenou os seres humanos e resolveu – com exceção de uma família – afogar todos eles, incluindo as crianças, e também, por via das dúvidas, o resto dos animais, presumivelmente os inocentes, de certo…

Deus é bom? Deus é perfeito? Por que condenou crianças? Vamos fazer um problema de matemática com isso utilizando Gênesis como propõe a secretária executiva do MEC? Vamos!

Deus afogou 25 famílias com 4 crianças cada uma. Quantas crianças morreram sem ter culpa de nada?

Vamos agora para destruição de Sodoma e Gomorra. Foi Ló, sobrinho de Abraão, o escolhido para ser poupado junto com a sua família por ser especialmente correto.

Dois anjos foram enviados a Sodoma para avisar a Ló e dizer que ele saísse da cidade antes da chegada do enxofre.

Ló recebeu os anjos com hospitalidade, e então, todos os homens de Sodoma reuniram-se em torno da casa dele e exigiram que Ló entregasse os anjos para que eles pudessem sodomizá-los: “Onde estão os homens que vieram para sua casa esta noite? Traze-os para que deles abusemos”(Gênesis, 19,5).

A bravura de Ló ao recusar-se a ceder à exigência sugere que Deus deve até ter tido razão ao considerá-lo o único homem de bem de Sodoma.

Mas… a auréola de Ló fica manchada com os termos de sua recusa: “Rogo-vos, meus irmãos, que não façais mal; tenho duas filhas, virgens, e vo-las trarei; tratai-as como vos parecer, porém nada façais a estes homens, porquanto se acham sob a proteção de meu teto” (Gênesis, 19,7-8).

Por mais estranha que a história possa parecer, ela certamente nos indica alguma coisa sobre o respeito reservado às mulheres nessa cultura inteiramente religiosa.

Bom tema para discutirmos gênero em sala, o papel da mulher na história e coisa e tal. Réchi tégui fica a dica.

No final, a oferta que Ló fez da virgindade de suas filhas mostrou-se desnecessária, pois os anjos conseguiram afastar os opressores cegando-os por milagre.

Pausa para uma boa questão de matemática utilizando Gênesis:

Os anjos de Ló cegaram 27 soldados. Quantos olhos deixaram de enxergar por conta desse crime?

Voltando à Bíblia. Eles então advertiram Ló para que partisse imediatamente com a sua família e seus animais porque a cidade estava prestes a ser destruída. A família inteira escapou, com exceção da pobre mulher de Ló, que o Senhor transformou num pilar de sal por ter cometido a ofensa de olhar para trás para ver os fogos de artifício.

Vejam vocês, a curiosidade de uma mulher na Bíblia foi duramente condenada.

Bora seguir que eu adoro a Bíblia em sala de aula:

As duas filhas de Ló fazem uma breve reaparição na história. Depois da mãe delas ter sido transformada num pilar de sal, elas moram com o pai numa caverna, no alto de uma montanha. Carentes de companhia masculina, adivinha (!), elas decidem embebedar o pai e copular com ele.

Ló não percebeu quando sua filha mais velha chegou a sua cama, mas não estava bêbado demais para engravidá-la. Na noite seguinte as duas filhas combinaram que era a vez da mais nova. Novamente Ló estava bêbado e engravidou a mais nova também (Gênesis, 10, 31-36).

Vamos usar a Bíblia para nos inspirarmos em questões de biologia?

Considerando o cruzamento genético e o papel do ambiente no desencadeamento de problemas, as chances de um recessivo se manifestar é de 50%. Por que o risco é 100 vezes maior quando Ló transa com as filhas do que se elas tivessem copulado com os soldados, por exemplo?

Cá para nós, se essa família tão perturbada era a melhor que Sodoma tinha a oferecer em termos de princípios morais, dá até para entender o enxofre punitivo mandado por Deus!

A história de Ló e os sodomitas ressoa de forma assustadora no capítulo 19 do livro dos Juízes, quando um levita (padre) não identificado viajava com a concubina em Jebus.

Eles passaram a noite na casa de um velho hospitaleiro. Enquanto jantavam, os homens da cidade chegaram e bateram à porta, exigindo que o velho entregasse seu convidado “para que dele abusemos”.

Praticamente com as mesmas palavras de Ló, o velho disse: “Não, irmão meus, não façais semelhante mal; já que o homem está em minha casa, não façais tal loucura. Minha filha virgem e a concubina dele trarei para fora; humilhai-as e fazei delas o que melhor vos agrade; porém a este homem não façais semelhante loucura”(juízes 19, 23-24).

Acho o termo “humilhai-as” especialmente aterrador. É como se dissesse: Divirtam-se humilhando e estuprando a minha filha e a concubina desse padre, mas mostrem o devido respeito por meu convidado, que, afinal de contas, é homem!

A concubina não teve a mesma sorte que as filhas esquisitas de Ló. O levita a entrega à multidão que a estupra coletivamente a noite inteira: “E eles a forçaram e abusaram dela toda a noite até pela manhã; e , subindo a lava, a deixaram. Ao romper da manhã, vindo a mulher, caiu à porta da casa do homem, onde estava o seu senhor, e ali ficou até que se fez dia claro”(Juízes 19, 25-26).

De manhã o levita encontra a concubina prostrada na porta e diz: “Levanta-te e vamos”. Mas ela não se moveu.

Estava morta.

Então ele “tomou um cutelo e, pegando a concubina, a despedaçou por seus ossos em doze partes; e a enviou por todos os limites de Israel”.

Sim. Você leu certo. Pode olhar em Juizes 19, 29.

Vamos fazer um probleminha de matemática utilizando as partes do corpo da concubina para estudar fração?

Vou passar essa.

Podemos ir além nesse história bíblica que deve ser debatida em sala de aula. Havia um motivo para esse esquartejamento: provocar uma vingança.

E deu resultado, pois o incidente causou a guerra de desforra contra a tribo de Benjamim, na qual, como o capítulo 20 de Juízes ternamente registra, mais de 60 mil homens foram mortos.

Matemática? Probleminhas? Vamos fazer? Deus é o matemático mais perfeito que existe, segundo o MEC. Bora?

Depois eu faço. Continuando.

Essa história é tão parecida com a de Ló que não dá para não especular se algum fragmento do manuscrito sem querer não se misturou em algum escritório esquecido de um monastério.

Calma que isso não é nada! As aulas podem ficar ainda mais interessantes!

–  Abram a Bíblia na página tal! Hoje a aula vai ser sobre Abraão!

Todos os episódios desagradáveis citados acima não passam de pecadilhos se comparados à infame lenda do sacrifício de filho de Abraão: Isaac.

Deus determinou que Abraão transformasse seu filho querido em oferenda em forma de fogo. Abraão construiu um altar, colocou lenha sobre ele e amarrou Isaac sobre a lenha.

(Questão sobre física boa aqui. Como o atrito gera calor…)

A faca assassina já estava em suas mãos quando um anjo interveio drasticamente, com a notícia de uma mudança de planos de última hora: Deus estava apenas brincando, no fim das contas, estava apenas testando a fé de Abraão.

Ufa!

Mas, como uma criança conseguiria se recuperar de tamanho trauma psicológico?

Fica a dica para aulas de Moral e Cívica. Podemos discutir que Deus foi bom pois poupou a vida de Isaac no último minuto.

Isso prova que Deus realmente é bom, mas quero ver como vai explicar a onisciência se baseando nessa história… Por que Ele não foi capaz de entrar na cabeça de Abraão e poupar a criança do trauma?!

Vai ser um excelente debate.

Em Juízes, capítulo 11, o líder militar Jefté fez uma troca com Deus combinando que, se Deus garantisse a vitória de Jefté sobre os amonistas, Jefté sacrificaria, sem falta, na fogueira, “aquele que sair primeiro da porta da minha casa e vier ao meu encontro, voltando eu.”

(Analisar a gramática e o estilo da Bíblia nas aulas de português. Não faltam frases interessantes).

Jefté tinha mesmo a intenção de derrotar os amonistas e voltou para a casa vitorioso.

Como era de se esperar, sua filha, única filha, saiu de casa para recebê-lo e, que pena, foi a primeira a sair pela porta…

Jefté rasgou suas roupas, compreensivelmente, mas não havia nada que pudesse fazer. Deus estava ansioso pela oferenda prometida, e dadas às circunstâncias, a filha, respeitosamente, concordou em ser sacrificada.

Ela só pediu permissão para ficar dois meses na montanha para lamentar a sua virgindade. Ao fim desse período ela voltou, obediente, e seu pai a cozinhou. Deus não achou por bem intervir nesse caso.

(Questões sobre geografia e biologia aqui. Pressão em montanhas, falta de oxigênio, hemácias e coisa e tal.)

Vou adorar chegar em sala com o Novo Testamento! Venha nimim, MEC!

Jesus, meu ídolo! Se Jesus não era comunista era radicalmente contra um sistema que permite que uns tenham de tudo e outros quase nada.

E mais! Jesus estaria a favor, certamente, das políticas sociais instaladas no Brasil no governo do PT pois ele foi O Cara que distribuiu pão e multiplicou os peixes e só depois é que ensinou a pescar porque sabe que “quem tem fome tem pressa”.

Jesus seria contra essas reformas todas que só prejudicam os pobres e seria Réchitégui-EleNão nas cabeças. Petralhudo, mortadelaço ou algo que o valha seriam os apelidos de Jesus.

Jesus era um típico pé rapado. Vivia descalço de vestidão, parecia que nunca viu um pente e uma tesoura para aparar aquela barba. Ele era contra o consumismo, meus alunos. Parecia um universitário de humanas.

Percebem? Não tinha vaidades, não usava terno e maletas, principalmente, não tinha preconceito algum.

Jesus não julgou ninguém. “Atire a primeira pedra aquele que…” é A Frase mais LGBTT que eu já vi nesse mundo!

“Não faça com os outros aquilo que você não quer que façam com você” resume todo o resto.

Já me vejo falando em sala de aula com a Bíblia na mão emocionada:

– Eu tenho a impressão, meus alunos e minhas alunas, de que se Jesus voltasse, a primeira coisa que ele faria era tacar uma bomba (no sentido metafórico ou quem sabe mesmo literal) em várias Igrejas que doutrinam as pessoas e as obrigam praticamente a selecionar somente um tipo de amor que lhes é permitido e ainda por cima lucram exorbitantemente falando coisas que Jesus jamais proferiu e vendendo de tudo com a Sua imagem.

E continuaria:

– Há uma passagem que eu adoro em que Jesus chega chutando literalmente o pau da barraca. Quando ele chega no Templo de Jerusalém e vê um punhado de gente vendendo vários badulaques, Jesus fica possesso e sai quebrando tudo. O que ele faria no Templo do Salomão? Ou vá lá, no Vaticano? O que ele faria vendo Malafaia oferecendo todos os dias produtos em sua rede?

– Jesus queimaria pneus no meio de estrada contra medidas que estão querendo nos impor que prejudicam a classe trabalhadora? Vamos debater esse tema, turma!

Concluiremos em sala de aula que se Jesus voltasse, ele seria crucificado de novo.

Exatamente pelas pessoas que falam diariamente em Seu nome e me obrigam a isso.

Vai ser lindo. Adorei a ideia e já penso em começar na semana que vem! Estou empolgada!

Do Blog de Elika Takimoto

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