Bruna Frascolla
O Twitter é de inegável importância para conseguir notícias quentes. O melhor exemplo disso talvez seja a saída de Biden da corrida eleitoral: em vez de convocar uma coletiva de imprensa, os Democratas simplesmente usaram a conta de Biden no Twitter para postar a carta com o anúncio. No entanto, também é inegável que o Twitter requer uma boa dose de ceticismo e experiência, pois, mesmo com o advento das notas da comunidade, há uma infinidade de charlatães e mentirosos. As notas da comunidade foram um remédio muito modesto para curar os males da monetização. Como vimos no caso do Youtube, monetização é um estímulo à mentira, já que inventar absurdos é um jeito de atrair a audiência de um grande número de crédulos.
A confusão eleitoral na Venezuela trouxe uma variável extra ao problema: Elon Musk, o dono da plataforma, tomou partido abertamente. E, assim como muitos usuários da rede, divulgou um gráfico errôneo da Tele Sur para “provar” que a eleição havia fraudada, pois na apuração o somatório dos votos dos candidatos daria mais que 100%. A notícia correu o Twitter inteiro, e no dia 29 de julho Elon Musk divulgou-a com o comentário: “Grande fraude eleitoral de Maduro”. Até o presente momento, não há nenhuma nota comunitária corrigindo essa mentira do dono da rede social. As famigeradas agências de checagem tampouco parecem ter se empenhado muito em denunciar a mentira. Já os direitistas do Twitter, convencidos de que todos os meios de comunicação tradicionais são “comunistas” e portanto apoiam Maduro, tomaram por verdade absoluta aquilo que só deu no Twitter e nenhum veículo de mídia tradicional noticiou. Antigamente, só membros de seitas religiosas se achavam sábios por não lerem jornais nem verem TV…
A fraude escancarada foi, portanto, uma parte da realidade alternativa do Twitter. O quadro geral era o de um país em plena convulsão social, de modo que não poucos observadores contrários a Maduro estavam certos de que este estava prestes a ter um fim similar ao de Ceaușescu. Isso seria fácil de desmentir se os observadores não tivessem selecionado suas fontes de informação segundo suas preferências políticas; assim, não importava que os apoiadores de Maduro, dentro e fora da Venezuela, postassem fotos de comícios imensos, de fazer inveja a Lula.
Quando o fim à Ceaușescu deixou de se afigurar no horizonte, vieram os vídeos de repressões brutais à oposição – com direito a uma senadora colombiana sendo pega na mentira, tuitando cenas de um filme como se fossem reais de tortura de opositores venezuelanos. Como ela não é Elon Musk, ganhou uma nota da comunidade. Mas se uma senadora teve essa coragem, quantas contas não terão feito isso? Mal podemos imaginar a percepção de quem é contra Maduro e estava tentando se informar pelo Twitter.
Diante disso, convém lembrar que o processo de compra do Twitter se iniciou logo após o início da operação especial russa na Ucrânia. À época, o Twitter era uma plataforma woke de Jack Dorsey; ela implementava censura distribuía selos azuis discricionariamente para perfis que teriam uma maior confiabilidade.
Pois bem: com o conflito na Ucrânia foi quase a mesma coisa; a diferença era que a plataforma melava a sua credibilidade ao distribuir selos azuis a perfis pró-Kiev que juravam que a guerra estava quase ganha. Já com a compra de Elon Musk, criou-se essa ficção de que o Twitter, agora X, pertencia a um libertário que defende a liberdade de expressão e representa o espírito da Primeira Emenda. O aumento de conflitos pelo globo tornará cada vez mais difícil negar a mão da Estado norte-americano nas suas plataformas digitais (sabiamente substituídas na China e na Rússia por alternativas nacionais).
Que o ideal de liberdade de expressão é uma lenda, esta Strategic Culture Foundation mostra muito bem, já que é impossível tuitar os seus links.