Ex-ministro da Secretaria de Governo, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, por exemplo, deixou de lado a timidez e concedeu entrevista, nesta segunda-feira, à agência britânica de notícias British Broadcasting Company (BBC), uma das mais influentes do mundo
Se na caserna as críticas ao governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) são abafadas pela ordem unida dos comandantes militares, que apoiaram o golpe de Estado em 2016 e a queda da presidenta deposta Dilma Rousseff (PT); fora dos quartéis fica mais difícil para o regime calar os seus opositores, mesmo aqueles que já deixaram a farda e se encontram na reserva tática das Forças Armadas.
Ex-ministro da Secretaria de Governo, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, por exemplo, deixou de lado a timidez e concedeu entrevista, nesta segunda-feira, à agência britânica de notícias British Broadcasting Company (BBC), uma das mais influentes do mundo. Na conversa com jornalistas britânicos, Santos Cruz não poupou o ex-chefe.
Corrupção
Aos jornalistas da BBC, o militar da reserva afirmou que Bolsonaro já não combate mais a corrupção, como havia prometido aos seus eleitores.
— Eu não entraria em um partido hoje do presidente Bolsonaro de jeito nenhum. Ele tem valores que não coincidem com os meus; ele tem atitudes que eu acho que não têm cabimento — destacou o militar.
Segundo Santos Cruz, “(o combate à) corrupção, da maneira que estava estruturada no momento da eleição, você tinha operação Lava Jato, na realidade a Polícia Federal, Ministério Público trabalhando nisso, você tinha o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). São os instrumentos (com) que você combate corrupção, controlando lavagem de dinheiro. Esses mecanismos sofreram um pouco de desgaste — continuou.
Moro
Segundo o ex-ministro, “o Coaf, quando foi para o Banco Central (por escolha do governo Bolsonaro), muitos percebem que ele trocou de nome e reduziu atividade”.
— A própria operação Lava Jato passou, passa por diversos desgastes também. A própria Polícia Federal, teve um período ali de muita pressão sobre o diretor para ser trocado ou não (em setembro, o presidente disse que a PF precisava de uma “arejada” e que Moro podia trocar o diretor Maurício Valeixo, o que não se concretizou). Essas coisas atrapalham — criticou.
Alinhamento
A BBC perguntou ao general se, em mensagem de Natal transmitida em cadeia nacional de televisão, o presidente Bolsonaro afirmou que, no seu governo, não há mais ideologia na política externa.
Retrocesso
Santos Cruz discordou. De acordo com o ex-ministro, a atuação do governo, no campo internacional, “é completamente ideológica”.
— Desde o discurso de posse do ministro das Relações Exteriores (Ernesto Araújo), quase transformando a Bíblia num plano de governo, e outras como a parte de mudar nossa embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, a maneira como se aproximou dos Estados Unidos. (Quero dizer,) Não se aproximou, porque nós somos próximos dos Estados Unidos, mas a maneira como mostrou essa prioridade sem nenhum cuidado — pontuou.
Para Santos Cruz, houve “um alinhamento automático. Isso é absolutamente ideológico”.
— Depois, houve um retrocesso (no viés ideológico) do próprio discurso de campanha quando (Bolsonaro) dizia que a China ia comprar o Brasil, que isso não ia ser permitido, etc, (e em outubro) acabou viajando para a China. Então você pode considerar até que deu para trás ideologicamente por uma questão de necessidade. O restante foi absolutamente ideológico — recordou.
Família
O oficial do Exército, com grande prestígio nas Forças Armadas, acredita que estes fatores determinados pela subserviência do presidente aos interesses norte-americanos afetam a imagem do Brasil e a forma como os outros países se relacionam conosco.
— Você vê que o presidente Bolsonaro não pôde ir à Nova York receber um prêmio (da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos em maio). Nova York é um lugar internacional que todo mundo vai. O presidente do Brasil não pôde ir por que? Por causa de condutas ideológicas que prejudicaram a imagem dele — disse.
Santos Cruz também destaca a interferência de familiares na condução do governo.
— A influência familiar, por exemplo, eu acho que não é boa, a sociedade brasileira não aceita. Ela votou no presidente Bolsonaro, ela não votou na família Bolsonaro. Na sociedade brasileira, a gente não gosta nem que parente se meta na vida particular da gente, muito menos num ambiente nacional. O presidente tem uma responsabilidade muito grande e todas essas interferências acabam trazendo desgaste para ele mesmo, eu acredito — concluiu.
Fonte: CdB