A professora Nathália Queiroz trabalhou para Jair Bolsonaro quando ele ainda exercia o mandato de deputado federal. Um pedido de investigação por parte do MPE-RJ, segundo apurou a reportagem do Correio do Brasil, será encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma vez que presidente da República tem foro privilegiado.
“Fio desencapado”, conforme a descreve a jornalista Thais Oyama — autora do livro Tormenta – O governo Bolsonaro: Crises, intrigas e segredos (Companhia das Letras) — a personal trainer Nathália Queiroz, filha do ex-assessor da família Bolsonaro Fabrício Queiroz volta ao noticiário policial. Ela aparece, agora, em relatório do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPE-RJ), vazado para o diário conservador paulistano Folha de S. Paulo (FSP), como suspeita de repassar recursos ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Nathália Queiroz trabalhou para Jair Bolsonaro quando ele ainda exercia o mandato de deputado federal. Um pedido de investigação por parte do MPE-RJ, segundo apurou a reportagem do Correio do Brasil, será encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma vez que presidente da República tem foro privilegiado.
Segundo documentos aos quais a reportagem teve acesso, a filha contratada pelo então parlamentar federal do PSL e demitida no mesmo dia em que Fabrício Queiroz — funcionário do gabinete do deputado estadual à época Flávio Bolsonaro — repassava a maior parte do salário pago, sem ela comparecer um dia sequer à Câmara dos Deputados, para as contas bancárias que o pai gerenciava.
Repasses
Informações levadas ao MPE-RJ com a quebra de sigilo bancário de Nathália Queiroz, autorizada pela Justiça, mostram que ela “transferiu R$ 150.539,41 para a conta do policial militar aposentado de janeiro de 2017 a setembro de 2018, período em que esteve lotada no gabinete de (Jair) Bolsonaro. O valor representa 77% do que a personal trainer recebeu da Câmara dos Deputados. A dinâmica dos repasses é a mesma descrita pelo Ministério Público do Rio de Janeiro sobre a suposta ‘rachadinha’ no antigo gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa fluminense”, revela a investigação.
“Promotores identificaram que Nathália repassou ao menos 82% de seus vencimentos para o pai no período em que esteve lotada na Assembleia do Rio, de dezembro de 2007 a dezembro de 2016. As transferências ou depósitos ocorriam sempre em até uma semana após o recebimento do salário. Dinâmica semelhante se deu na Câmara dos Deputados”, acrescenta. A quase a totalidade dos repasses ocorreu entre os dias 21 e 24 de cada mês, data em que os servidores costumam receber seus salários, disseram os promotores à FSP.
Preso em regime domiciliar, com uso de tornozeleira eletrônica, Fabrício Queiroz é apontado pelo MPE-RJ como o operador financeiro do esquema da “rachadinha”, prática que consiste no desvio de recursos públicos com a devolução de parte dos salários de assessores ao parlamentar, muitos recebendo sem sequer comparecer ao local de trabalho, conhecidos como “funcionários fantasmas”. Flávio Bolsonaro e Queiroz são investigados nos crimes de peculato, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e organização criminosa.
Transferências
Segundo os promotores do caso, o dinheiro ilícito era usado para o pagamento de despesas pessoais do hoje senador. Nathalia, à época, atuava como professora de ginástica, no Rio de Janeiro, no mesmo período em que deveria trabalhar para Bolsonaro, em Brasília, de dezembro de 2016 a outubro de 2018.
Nas redes sociais, Nathália Queiroz aparecia ao lado de famosos como os atores Bruno Gagliasso, Bruna Marquezine e Giovanna Lancellotti; além de socialites cariocas. A professora de Educação Física atuava nas academias cariocas e nas praias da Zona Sul carioca.
Segundo o MPE-RJ, “os repasses de Nathália representaram 30% dos R$ 2 milhões arrecadados de 2007 a 2018 na suposta ‘rachadinha’ com origem identificada. Incluindo os valores da Câmara, o peso dos repasses da personal trainer entre as transferências com origem identificada sobe para mais de um terço (35,4%)”.
Os investigadores, no entanto, analisaram apenas as transferências da filha de Queiroz feitas no período em que ela esteve nomeada no gabinete de Flávio — o presidente não pode ser investigado pela Promotoria estadual. “A análise dos repasses feitos quando ela esteve no gabinete do presidente é possível porque a quebra de sigilo abrangeu todos os investigados de janeiro de 2007 a dezembro de 2018”, explica.
Dinheiro vivo
“Além de Nathalia, são suspeitas de participação no esquema a mulher de Queiroz, Márcia Aguiar, e outra filha, Evelyn. Somada, a família do ex-assessor de Flávio representa 58% da movimentação com origem conhecida e considerada criminosa pelo MP-RJ. Há a suspeita de que o valor movimentado no esquema seja maior do que os R$ 2 milhões com origem identificada.
“Investigadores consideram a possibilidade de que outros ex-assessores faziam seus repasses em espécie para Queiroz, sem depósito em conta, inviabilizando sua identificação como parte do esquema”, pontua.
O ex-PM também movimentou outros R$ 900 mil no período de 12 anos. Os promotores afirmam que parte desse valor também pode se referir a depósitos de assessores cuja identificação não foi possível. Todo o dinheiro vivo do esquema, segundo o MP-RJ, pode ter sido usado para pagar despesas pessoais de Flávio Bolsonaro.
Sem comentários
“O senador quitou boletos escolares e de plano de saúde com recursos em espécie ao longo de cinco anos. Os investigadores conseguiram identificar que Queiroz foi o responsável pelo pagamento em ao menos uma oportunidade, em outubro de 2018”, apurou a reportagem.
Em recente entrevista ao diário conservador carioca O Globo, Flávio Bolsonaro reconheceu que seu ex-assessor pagava suas contas pessoais. Mas alegou que os pagamentos eram feitos com seu dinheiro, de fonte lícita. O MPE-RJ, porém, não identificou saques compatíveis com o pagamentos dos boletos nas contas bancárias do filho do presidente.
Os advogados de Queiroz afirmam, em nota, que os repasses seguiam a lógica de “centralização das despesas familiares na figura do pai”. Também procurada pela reportagem, a Presidência da República afirmou que não comentaria o caso.
Fonte: CdB