Com apoio irrestrito do Vaticano, os progressistas se reforçam diante dos fatos negativos produzidos pelo governo e a maioria dos bispos articula, internamente, uma frente para que a instituição se posicione de forma efetiva no debate contra o governo de Bolsonaro
O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) está prestes a conhecer um adversário de uma dimensão que, até agora, foi percebida em apenas alguns momentos históricos. Entre os exemplos mais recentes, as ‘Diretas, Já!’ e a resistência à ditadura militar tiveram a participação, sempre discreta e extremamente efetiva da Igreja Católica, a mesma que se articula, agora, para encerrar o voo cego do mandatário neofascista.
Aparadas as arestas internas na Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), após a disputa entre conservadores e progressistas nas eleições que culminou na vitória do bispo mineiro Walmor Oliveira de Azevedo, afinado com o papa Francisco e os setores mais humanistas da Igreja, a instituição passa a articular um movimento nacional para garantir a democracia, ameaçada por planos ditatoriais da ultradireita no controle do governo Bolsonaro, aliada a uma parcela do setor militar.
Com apoio irrestrito do Vaticano, os progressistas se reforçam diante dos fatos negativos produzidos pelo governo e a maioria dos bispos articula, internamente, uma frente para que a instituição se posicione de forma efetiva no debate contra o governo de Bolsonaro. Dois bispos falaram à reportagem do site de notícias Brasil de Fato (BdF) e confirmaram a existência de um consenso em torno da necessidade de neutralização do movimento neofascista.
Perseguição
A ala conservadora da Igreja, liderada por Dom Orani João Tempesta, Arcebispo do Rio de Janeiro, “que tem ligação com o presidente e chegou a fazer campanha por ele nas eleições de 2018 –, está ‘tímida’ com ‘os despropósitos das medidas de Bolsonaro, que atacam os povos mais pobres, indígenas e quilombolas”, afirma o BdF.
“De acordo com os bispos, essa movimentação não está restrita à CNBB, mas tem encontrado eco em paróquias e igrejas pelo país, onde padres reclamam de perseguição política, por conta das críticas feitas ao governo de Bolsonaro nas missas ou em conversas com fiéis”, acrescenta.
Ainda segundo a página, “há um debate corrente entre os bispos sobre a baixa interferência da CNBB no debate político. Isso seria, de acordo com os líderes religiosos, resultado da insistência da entidade em divulgar ‘apenas notas’ sobre os temas nacionais. A ideia seria, portanto, que os religiosos sejam mais propositivos e atuantes”, pontua.
A voz da CNBB, apesar de ser uma voz importante, perdeu força ao longo tempo, não tem sido tão reconhecida midiaticamente. A CNBB não está influente — lamentou um dos bispos.
Clima hostil
A reação das hostes neofascistas, no entanto, é sempre violenta. No último dia 9 de julho, um grupo de 300 religiosos ligados à Igreja, entre eles alguns bispos, deram uma rápida resposta aos críticos do padre Edson Adélio, de Artur Nogueira, município no interior de São Paulo, que foi perseguido após criticar o presidente em uma missa.
“Nós nos alegramos com sua voz profética que se levanta para denunciar todo esse projeto de morte que vem sendo implantado! Saiba que você não está sozinho. Conte sempre conosco e com nossa solidariedade. E agradecemos ao bom Deus que não deixa morrer a profecia. Continua a suscitar homens de coragem e de compromisso. Continue sendo essa voz que denuncia tudo o que diminui ou mata a vida de nosso povo”, afirmam os religiosos, em nota assinada pela organização religiosa Padres da Caminhada.
Na missa do dia 7 de junho, o padre Adélio disse aos fiéis que esse “governo não presta”.
Bolsonaro não vale nada e quem votou nele deveria se confessar e pedir perdão pelo pecado que cometeu, elegeu um bandido — afirmou o religioso.
Reino de Deus
O vídeo com a mensagem do padre Edson foi publicado na internet e ele passou a ser perseguido, sistematicamente, por seguidores de Bolsonaro. O tom da Igreja, no entanto, voltou a subir no último domingo. Durante o debate inter-religioso “Fora Bolsonaro e o desgoverno federal”, Dom Vicente Ferreira, bispo auxiliar de Belo Horizonte (MG), que integra a Comissão Especial para a Ecologia Integral e Mineração da CNBB, desmascarou o mandatário neofascista.
Nós estamos num confronto direto do reino de Deus com o reino de morte. De fato, tudo aquilo que contribui para o reino de Deus, é nosso lugar e endereço no mundo. Agora, não posso compactuar com aquilo que é morte — afirmou Ferreira, que encerrou sua participação no evento dizendo que “não há esperança nesse governo, infelizmente.
Dom Mauro
O lendário bispo Mauro Morelli, por sua atuação na Baixada Fluminense durante os anos mais violentos da ditadura militar, também criticou Bolsonaro durante debate.
Um governo que governa em favor de um grupo pequeno e poderoso da economia. Esse governo que está desrespeitando os povos indígenas, que está prejudicando os quilombolas, prejudicando a agricultura familiar e a saúde do povo. É muito pouco trocar o personagem — concluiu o bispo, que vive atualmente no interior de Minas Gerais.
Fonte: BdF