Amaro Lins faz uma análise do crescimento das universidades nos últimos anos e dos cortes anunciados pelo MEC
Amaro Lins foi reitor da Universidade Federal de Pernambuco de 2003 a 2011, secretário de educação superior do Ministério da Educação nos anos de 2011 e 2012 e hoje é professor do Departamento de Engenharia Civil da UFPE. Em entrevista ao Brasil de Fato, o professor fez uma análise das mudanças feitas pelo Ministério da Educação na gestão do ministro Abraham Weintraub e do presidente Jair Bolsonaro.
O ministro Abraham Weintraub justificou os cortes na educação superior pública afirmando que o que é feito nas universidades brasileiras é balbúrdia. Nesse sentido, o que o professor entende como balbúrdia?
Amaro Lins: É interessante que essa mesma pergunta foi feita ao ministro da educação. E para ele, balbúrdia é a universidade promover o debate, a integração, a busca da compreensão da diversidade que nós temos na sociedade brasileira. Ele considera balbúrdia a universidade discutir política. O que nós, povo brasileiro, percebemos, é que balbúrdia é essa transformação que estão fazendo para voltar à idade média, à irracionalidade. A universidade é o lugar por excelência da diversidade. Se o ministério chama isso de balbúrdia, é porque acho que chegamos no fundo do poço. As universidades e a educação básica precisam estar à serviço do desenvolvimento nacional, que é econômico, mas com forte impacto no social.
Como analisar esses cortes propostos pelo MEC?
Era preciso dar continuidade a esse período fértil que vinha passando a educação brasileira, especialmente nos últimos 15 anos. Nós estávamos passando por um processo de transformação na educação. Esse corte agora é um suicídio e todo nós sabemos e o governo também sabe. O governo disse que investiria e melhoraria a educação básica, e, olhando para a tabela de cortes, a educação básica teve um corte de 39% a 68% do total de investimentos. Onde são esses cortes? na construção de novas creches, na melhoria das salas de aula, na formação de professores. Isso tem um impacto tremendo. Os Institutos Federais com corte de 35% e a as universidades de 30%. Isso vai paralisar as universidades. Nós vamos voltar a uma época que não vai ter nem giz.
Quais podem ser os impactos para o funcionamento das universidades, especialmente em relação à infraestrutura e o desenvolvimento de projetos?
Esse corte vai afetar fortemente a estrutura das universidades. Ele vai interromper os projetos de extensão, que são voltados para a sociedade e será um corte importante nas pesquisas que estão em andamento. Se você para uma pesquisa por um ano ela não retorna do ponto onde parou. O mesmo acontece se reduzem os investimentos nos alunos de baixa renda, eles não tem mais como frequentar a universidade porque não tem condições subsistir. Os programas de bolsas de manutenção vão parar. Algumas áreas são mais críticas, como as licenciaturas. Você precisa formar bons professores, que é onde tudo começa. Aí o governo “Ah, vamos investir na educação básica” mas a educação básica começa na formação de professores, e é a universidade que faz isso. No geral, esse desinvestimento na universidade resulta num crescimento e desenvolvimento menor, no agravamento da situação social. Foi um esforço enorme para que a educação chegasse aos jovens e aos adultos e isto está sendo jogado no lixo. Isso é motivo suficiente para as pessoas saírem para as ruas. O nosso futuro está correndo um grave risco. Cabe a cada um de nós se posicionar para que esse sucateamento não seja efetivado e que possamos retomar aquele crescimento virtuoso com o avanço da educação, ciência e tecnologia.
Ultimamente, Bolsonaro vem questionando a relevância das ciências humanas. Como podemos analisar essa movimentação?
A universidade deve representar o conjunto de áreas do conhecimento para formar cidadãos e cidadãs conscientes do seu papel na sociedade e com capacidade de intervir na realidade do seu país. Para isso é preciso que exista uma harmonia na formação de diversas áreas. A tecnologia, por exemplo, tem feito coisas assombrosas, até o aumento da expectativa de vida, mas essa tecnologia precisa de direcionamento, ser aplicada de maneira adequada. Mas como isso vai acontecer se as pessoas não tem uma formação humanística, em sociologia e filosofia? Se não houver essa capacidade de educação, vira um caos. Paulo Freire sempre ressaltou o papel da educação para a autonomia e a cidadania, é pra isso que serve a educação. Quando se retiram os recursos da área de humanas, isso gera conflitos, porque estará sendo feita uma formação defeituosa. Essa ideologização absurda na universidade não existe. Essas pessoas provavelmente não tiveram uma formação humanística. Elas vivem numa bolha, e numa bolha inclusive de grande perversidade.
Fonte: Brasil de Fato